Na obra "A República", o filósofo grego Platão idealiza Kallipolis, uma cidade livre de conflitos e problemas, na qual a cidadania plena é um privilégio universal. Essa concepção de harmonia social tornou-se um paradigma, orientando, ao longo dos séculos, os esforços das nações em busca de uma sociedade mais equitativa e próspera. No entanto, mais de dois milênios após a formulação da utopia platônica, o tema da valorização da herança africana no Brasil ainda representa um obstáculo à efetivação de um tecido social verdadeiramente justo e equilibrado. Diante desse panorama, a ineficiência governamental e a perpetuação de preconceitos são fatores que favorecem esse quadro.

De fato, faz-se imprescindível ressaltar a omissão estatal acerca do nefasto cenário presente na valorização da herança africana. Em uma perspectiva analítica, o Estado perpetua a desordem temática quando não cumpre com seu dever administrativo em assegurar os direitos culturais dos afro-brasileiros. Um exemplo formidável se materializa quando observamos a falta de políticas públicas efetivas que promovam e incentivem a cultura afro-brasileira nas escolas e nas mídias. Analogamente, em virtude da eminente perpetuação de um impasse jurídico e social, há de se concordar com a crítica de Zygmunt Bauman: "A única coisa que podemos ter certeza é a incerteza", que coaduna em uma incógnita moderna acerca do bem comum aos afrodescendentes.

Outrossim, o estigma social fortalece veementemente a realidade distópica sobre a valorização da herança africana. De acordo com "O Paradoxo da Tolerância", de Karl Popper, é totalmente irreal um regime democrático tolerar o intolerante; no entanto, essa premissa não se faz presente no Brasil. Em um cenário ilustrativo, a dissonância dessa premissa sobre a herança africana se evidencia quando perpetuam-se preconceitos raciais e culturais, como o desprezo pelas tradições afro-brasileiras e a marginalização das festas populares de origem africana, como o Candomblé e a capoeira. Consequentemente, essa desvalorização resulta em uma exclusão cultural que impede a construção de uma identidade nacional plural.

Portanto, a fim de resolver o problema da valorização da herança africana no Brasil, o Estado deve colaborar com a questão e implementar políticas públicas que promovam educação antirracista nas escolas e valorizem as culturas afro-brasileiras já na formação inicial dos estudantes. Já as instituições culturais precisam apoiar iniciativas que resgatem e celebrem as tradições africanas por meio de eventos e programas culturais. Essas atitudes serão viabilizadas por meio da mútua colaboração entre os agentes envolvidos, haja vista que a harmonia social é um fator significativo para a resolução das mazelas contemporâneas. Dessa forma, intermediar-se-á o óbice à valorização da herança africana no Brasil.