Na obra “A República”, o filósofo grego Platão idealiza Kallipolis, uma cidade livre de conflitos e problemas, na qual a cidadania plena é um privilégio universal. Essa concepção de harmonia social tornou-se um paradigma, orientando, ao longo dos séculos, os esforços das nações em busca de uma sociedade mais equitativa e próspera. No entanto, mais de dois milênios após a formulação da utopia platônica, os desafios para a valorização da herança africana ainda representam, no Brasil, um obstáculo à efetivação de um tecido social verdadeiramente justo e equilibrado. Diante desse panorama, a indiligência governamental e o racismo estrutural são fatores que favorecem esse quadro.

De início, é importante destacar a desassistência do Poder Público como fator agravante da desvalorização do legado afro-brasileiro. A constituição de 1988, conhecida como “Constituição Cidadã”, consagrou os direitos sociais como fundamentos centrais da sociedade brasileira, estabelecendo o acesso à educação sociocultural como um dos pilares mais importante. Em um país que superou as cicatrizes da ditadura, garantir o ensino da herança africana no Brasil é vital para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Logo, sendo o Estado promotor do bem-estar social, como afirmou o filósofo americano John Rawls, é inconcebível relegar a valorização dos costumes, tradições, crenças e conhecimento da população negra do Brasil a segundo plano.

Além disso, é válido ressaltar o racismo estrutural quanto ao agravamento do problema. Na linha desse raciocínio, de acordo com a obra “A epistemologia da ancestralidade”, os aspectos culturais afro-brasileiros são marginalizados pelas classes dominantes. Diante de tal exposto, a cultura africana é confinada às minorias socialmente invisíveis. Portanto, combater a desvalorização da cultura negra no Brasil não apenas segue os preceitos da Carta Magna, como também é essencial para enfrentar essa questão de maneira eficaz no País.

Assim, ações concretas precisam ser adotadas para superar esse desafio. Em vista disso, o Governo Federal - encarregado de organizar o funcionamento do Estado e promover o bem-estar social - deve investir na criação de um Programa Nacional de Educação Afro-brasileira, por meio da elaboração de uma base curricular, para toda rede de escola pública, que aborda os aspectos da herança africana. Tal medida tem o objetivo de garantir a valorização do legado dos povos negros da nação. Dessa maneira, o Brasil estaria mais próximo de alcançar os ideais utópicos de justiça e harmonia delineados por Platão.